Toledo: um passeio pela capital medieval da Espanha
Toledo: um passeio pela capital medieval da Espanha
Texto e Fotos: Rogério Almeida
Antiga capital da Espanha, Toledo (em latim: Toletum) encanta à todos desde o tempo em que era dominada pelos romanos em 193 a.C, quando Marco Fulvio Nobilior conquistou a cidade. Pertencente à comunidade autônoma de Castela-Mancha, Toledo está a apenas 72km de Madri, e é uma das cidades medievais mais encantadoras de toda a Europa.
Toledo e o rio Tejo, que aqui se chama Tajo (Foto: Rogério Almeida)
Toledo foi capital do Reino Visigótico, conquistada pelo árabe Tariq ibn Zivad entre 714 e 715 e submetida ao domínio muçulmano. Os árabes chamaram-na deTulaytula (árabe ?????? ).
Bem mais tarde foi capital do Reino de Castela até o momento que Felipe II mudou a corte para Madri em 1561, época em que a cidade começou a entrar em decadência. Além de ser declarada pela UNESCO como Patrimônio da Humanidade é chamada de a cidade das 3 culturas: Cristã, Judaica e Islâmica.
Quem visita Madri, pode aproveitar e ir a Toledo e voltar no mesmo dia. De carro, o acesso é fácil e em apenas 40 minutos se chega à cidade. Quem optar por ir de trem, a partida é na Estação Atocha no centro de Madri. O AVE, trem de alta velocidade da Renfe, a estatal espanhola que administra as ferrovias do país, conecta Madrid e Toledo em apenas 30 minutos, com um serviço de primeira qualidade e alto conforto.
Ao se aproximar da cidade, vejo que Toledo está no topo de uma montanha e com o Rio Tejo, o mesmo de Lisboa e de Fernando Pessoa, mas que aqui se chama Tajo, serpenteando na parte mais baixa e refletindo em suas águas a arquitetura amuralhada de influências árabe e gótica.
Com um mapa da cidade e o acompanhamento de uma guia de turismo, realizei todo o percurso a pé. As primeiras palavras da guia dão conta de que Toledo é a cidade da tolerância por ter abrigado e convivido mutuamente com as três civilizações: judia, cristã (católica) e muçulmana.
Toledo, Patrimônio da Humanidade e Capital Espanhola da Gastronomia (Foto: Rogério Almeida)
Considerada Patrimônio da Humanidade desde 1986, percebo que a cidade é neste 2016 a Capital Espanhola da Gastronomia.
Nosso roteiro teve início quando subimos as escadas rolantes, em direção ao centro da cidade. A primeira parada é num mirante do Paseo del Carmen, em que se descortina a beleza de toda Toledo e aí se percebe que a cidade é totalmente medieval.
Rogério Almeida e a visão de Toledo do mirante do Paseo del Carmen
Do belvedere seguimos para o Palácio de Alcázar , com suas torres que podem ser vistas a quilômetros de distância e um dos mais importantes pontos turísticos de Toledo. O palácio foi construído por volta do século III pelos romanos e subsequentemente reformulado pelos cristãos.
Alcázar de Tolefo, palácio fortificado sobre rochas na parte mais alta de Toledo.
O Alcázar de Toledo que começou a ser construído na época romana, atravessou os séculos, foi quase totalmente destruído durante a Guerra Civil no cerco de 70 dias à cidade em 1936 e foi residência oficial dos Reis da Espanha durante muitos anos. E hoje abriga a Biblioteca de Castilla-La Mancha e o Museu do Exército.
Passando o Alcázar de Toledo caminhamos em direção ao Colégio de Nossa Senhora dos Remédios ou Real Colégio das Donzelas Nobres, fundado em 1551 pelo Cardeal Arcebispo de Toledo, Juan Martinez Silíceo para a educação de jovens nobres com poucos recursos. O prédio é considerado desde 1999 como Bem de Interesse Cultural na categoria monumento.
Real Colégio das Donzelas Nobres (Foto: Rogério Almeida)
Do outro lado da rua existe uma passarela de ferro fundido que liga o Colégio das Donzelas com o prédio vizinho, sede da Vice Presidência da Junta de Comunidades de Castilla-La Mancha.
Passarela de ferro que liga o Real Colégio das Donzelas com solar vizinho (Foto: Rogério Almeida)
Saindo do Real Colégio das Donzelas caminhamos pelas ruas estreitas de calçamento de pedras de Toledo e nos deparamos com lojas com armaduras, e que vendem facas e espadas. As espadas de Toledo conhecidas pela resistência estão famosas por serem as preferidas pelos diretores de cinema de Hollywood. Filmes como Highlander, O Senhor dos Anéis, Gladiador, 300, O Hobbit e muitos outros apresentam espadas feitas aqui. Por isso é possível comprar réplicas das espadas do Senhor dos Anéis, e também miniaturas de Dom Quixote de La Mancha e o seu fiel escudeiro Sancho Pança.
Armadura e Dom Quixote de La Mancha (Foto:Rogério Almeida)
Dom Quixote de La Mancha e seu fiel escudeiro Sancho Pança (Foto: Rogério Almeida)
Cervantes descreveu Toledo como a “glória da Espanha”. Na parte antiga bem no topo da montanha está a catedral de Santa Maria de Toledo, igreja primaz da Espanha. Do século V ao XVI foram realizados aqui cerca de trinta sínodos. Um deles o concílio de 681 assegurou ao arcebispo de Toledo a primazia no reino da Espanha.
Catedral de Santa Maria de Toledo, antiga mesquita de Toledo.
Considerada uma das três catedrais góticas da Espanha do Século XII e sede da Arquidiocese de Toledo, a Catedral de Santa Maria, é considerada a obra magna deste estilo no país e visita obrigatória na cidade.
Construída no século I por São Eugênio, foi transformada em mesquita pelas mãos dos muçulmanos durante a invasão árabe, sendo finalmente retornada aos cristãos e reconstruída na arquitetura gótica a partir da Catedral de Bourges, na França.
Interessante que a Catedral de Toledo, reúne características do estilo mudéjar, principalmente no claustro e possui um altar barroco, chamado El Transparente. Com mais de 750 vitrais, e com uma fachada com três portas intituladas. a Porta do Perdão, a do Juízo Final e do Inferno, a Catedral de Toledo também possui o túmulo do rei de Portugal, D. Sancho II e da Rainha Catarina de Lencastre.
Sinagoga de Santa María La Blanca (Séc. XIII) (Foto: Rogério Almeida)
Depois da catedral seguimos rumo a Sinagoga de Santa María la Blanca. Construída no Século XII, este monumento mudejar foi posteriormente convertida em igreja católica da Ordem de Calatrava e hoje é um museu preservando a religião judaica e declarado patrimônio mundial. Fiquei impressionado com a riqueza interior e as paredes brancas que dominam a Sinagoga.
Foto: Rogério Almeida
Toledo chegou a possuir 10 sinagogas. Da Santa María la Blanca nosso roteiro se volta para homenagear ao mais famoso artista plástico de Toledo. Na primavera de 1577 chega à cidade, um dos maiores gênios da pintura universal: Doménico Theotocópuli, nascido na Ilha de Creta e mais conhecido como “el Greco”.
Casa Armino, onde morou o pintor El Greco (Foto: Rogério Almeida)
A primeira parada é na casa Armino, onde morou o pintor El Greco. O artista veio a Toledo para trabalhar na pintura do do retábulo de Santo Domingo o Antigo, por encomenda do Reitor da Catedral Don Diego de Castilla. Aqui, El Greco manteve uma relação com a jovem Jerónima de las Cuevas, com quem teve um filho: Jorge Manuel.
Igreja de São Tomé onde se encontra a tela de El Greco, o Enterro do Conde de Orgaz (Foto: Rogério Almeida)
Uma das maiores atrações turísticas da cidade é a pintura deixada por El Greco na Igreja de São Tomé e intitulada o Enterro do Conde de Orgaz. Considerada uma das mais importantes da história da pintura mundial, a obra homenageia o piedoso Gonzalo Ruiz de Toledo, o senhor da vila de Orgaz e benfeitor da igreja.
O enterro do Conde de Orgaz, de El Greco, na Igreja de São Tomé em Toledo
A tela que domina uma parede da Igreja logo acima de onde se encontra os restos mortais de Gonzalo Ruiz de Toledo, é de um relato impressionante. Estão todos retratados: no centro da tela os Santos Estevão (jovem) e Santo Agostinho fazem o enterro de Gonzalo Ruiz de Toledo, “Conde de Orgaz”.
Ao lado está Jorge Manuel, filho de El Greco, que possui em seu bolso um pano branco com a informação:“Domenico Theotocopuli ,1578”.
Logo acima de uma mão na cabeça de Santo Estevão está nada mais do que o auto retrato do próprio El Greco. Há quem diga também que Miguel de Cervantes , que durante muitos anos residiu em Toledo também está retratado na tela.
Detalhe da tela de El Greco, o Enterro do Conde de Orgaz.
Na parte superior da tela, aparece Jesus Cristo vestido de branco se dirigindo a Pedro, que se encontra em sua direita, portando as chaves do paraíso. Abaixo está a Virgem Maria que se prepara para receber a alma de Orgaz, E bem defronte à Virgem está São João Batista e outros santos como Santiago e São Tomás, como patrono da igreja. Uma obra impressionante e que somente pela oportunidade de contemplá-la já valeu à pena ter visitado a cidade de Toledo.
Claustro do Mosteiro de São João dos Reis de Toledo (Foto: Rogério Almeida)
Concluindo a visita à parte católica de Toledo, o próximo destino foi o Mosteiro de São João dos Reis (Monastério de San Juan de los Reyes), da Ordem Franciscana.
Rainha Isabel I de Castela, a Católica (Foto:Rogério Almeida)
Logo à entrada se encontra uma tela da rainha Isabel I de Castela (1451 – 1504) que construiu o Mosteiro, com a intenção de transformá -lo em mausoléu real, comemorando a batalha do Toro (1476) e o nascimento do príncipe João.
Claustro do Mosteiro de São João dos Reis, uma das jóias da transição gótico espanhol para o Renascimento (Foto: Rogério Almeida)
É um dos mais valiosos edifícios no estilo elisabetano gótico da Espanha e o edifício mais importante construído pelos Reis Católicos. Em 1926 foi declarado monumento histórico-artístico de interesse nacional.
Pratos e souvenires com o Damasquinado, típico de Toledo (Foto: Rogério Almeida)
Na saída do Mosteiro encontramos várias lojas que vendem joias e pratos decorativos com a antiga forma de cunhar o ouro , chamada Damasquinado. Até visitamos uma fábrica.
Damasquinar significa literalmente incrustar, e dessa forma que é feito. São finíssimos fios de ouro ou prata embutidos nos relevos de algum metal como aço e ferro. Tudo uma herança do domínio árabe em Toledo. E o nome vem de Damasco, a capital da Síria. Na Europa o Damasquinado era usado primeiramente para decorar armas e armaduras, só no período renascentista é que começaram a usar mais em peças decorativas.
E a despedida de Toledo teria que ser por uma de suas portas. E escolhemos a Porta del Cambrón, no setor oeste da cidade. Também conhecida como Porta dos Judeus ou Porta de Santa Leocádia, esta Porta é considerada um Bem de Interesse Cultural e está bem na entrada do bairro judeu.
Porta del Cambron, no bairro judeu de Toledo (Foto: Rogério Almeida)
Interessante notar que recentemente a comunidade judaica da Espanha, conseguiu junto a Prefeitura de Toledo colocar símbolos judaicos nas ruas onde residiram os judeus sefarditas.
A porta de estilo renascentista sofreu danos durante a Guerra Civil Espanhola, mas os pares de torres e arcos nos saúdam nesta despedida da bela cidade de Toledo.
Informações Úteis:
Recomendo aos visitantes de Toledo a adquirir uma pulseira turística, no valor de 9 euros e que dá acesso gratuito a sete monumentos ou atrações turísticas. As pulseiras podem ser adquiridas em vários pontos da cidade e nos próprios monumentos.
Interessante também visitar a Fábrica Damasquinado Suarez ( Circo Romano 8. 45004 TOLEDO) e saber como é trabalhado com ouro o prato símbolo da cidade.